Relatório do Encontro Latino-Americano de Animadores de Justiça e Paz

Curitiba, (05-06/04/02)

Participantes:

  1. Pe. Carlos Alberto da Costa Silva, Cons. Geral.
  2. Pe. Renato Cadore (Imperatriz, Maranhão)
  3. Pe. Pedro Paloschi (Guabiruba, Santa Catarina)
  4. Pe. Lotívio Antonio Finger (Candelária, São Paulo)
  5. Fr. Ricardo Menay Pino (Santiago, Chile)
  6. Pe. Marcos Antonio Alves de Lima (Recife, Pernambuco)
  7. Pe. Mario Lovato (Pampa del Índio, Argentina)
  8. Pe. Nestor Adolfo Echert (Brusque, Santa Catarina)
Dia I:

Às 14:00 horas do dia 05 de Abril iniciamos o nosso IV Encontro Latino-Americano de Animadores De Justiça e Paz. O coordenador do encontro, Pe. Renato Cadore, deu as boas vindas a todos e logo após o Pe. Osnildo Carlos Klan, Superior da Região Brasileira Meridional, reforçou os sentimentos de alegria da sua região em nos acolher. Em seguida, rezamos juntos renovando a nossa inspiração na fonte divina e ideais dehonianos.

Após isto, o coordenador apresentou os objetivos do nosso encontro, a saber:

1) Avaliar, aprofundar, partilhar e propor novos passos para a implementação das decisões e orientações da Conferência Geral de Recife;

2) Oferecer aprofundamento (estudo) sobre questões sociais mais desafiantes de nossa realidade Latino-Americana;

3) Criar mais sintonia (intercâmbio) na nossa área geográfica no tocante ao trabalho social;

4) Definir com mais clareza o papel dos promotores de Justiça e Paz, bem como a sua participação no Encontro em Montreal (30/09 a 10/10 de 2002)

5) Oferecer uma carta compromisso aos demais membros da Congregação que expresse a nossa posição perante a realidade social, política, econômica e cultural da América-Latina.

Sendo discutido brevemente os objetivos, tivemos um questionamento do Pe. Mário Lovato acerca da programação temática do encontro, a qual deveria contar com um aprofundamento do tema da crescente pobreza em nossa região. Concluímos que, ao discutirmos a Globalização e o Papel dos Meios de Comunicação Social, o Papel das ONGs e a Análise Estrutural da Realidade, certamente tocaríamos no tema da crescente pobreza.

Em seguida, nosso coordenador fez um histórico da caminhada da Justiça e Paz na América-Latina tendo como base os encontros e assembléias realizados desde 1988 em Brusque até a última assembléia realizada em Buenos Aires de 29/01 a 01/02 de 2000, preparatória à Conferência Geral de Recife (Conf. Anexo I).

O Pe. Carlos Alberto, como Conselheiro Geral e responsável pela área de Justiça e Paz, ressaltou que o encontro atual insere-se na caminhada de incentivo do compromisso social da nossa família religiosa, conscientizando da importância do trabalho de Justiça e Paz. As comissões, assessorias ou secretariados locais devem firmar-se cada vez mais em seu papel motivador, formador/informador como uma missão verdadeiramente importante para a nossa Congregação. O próximo encontro internacional de Montreal surge como uma instância formadora/informadora assumida pelo Governo Geral à partir da Conferência Geral de Recife, como também animadora do compromisso social, especialmente aquelas propostas assumidas na Conferência de Recife .

Seguindo o programa do nosso encontro, prosseguimos com a “mesa redonda” sobre o tema dos Meios de Comunicação Social e a Globalização, guiados pelo Dr. Prof. Pedro Bernardi, professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. O mesmo guiou as nossa discussões com os seguintes pontos:

-entender melhor o fenômeno da globalização;

-diferenciar o processo de comunicação dos meios de comunicação com suas diferentes utilizações;

-entender a legislação e as políticas de comunicação;

-leitura rápida dos documentos conciliares em suas referências aos M.C.S.;

-como realizar um projeto de comunicação em sintonia com os objetivos da Justiça e da Paz voltado para a nossa realidade.

Segundo Bernardi, a globalização é um processo irreversível e tem benefícios que superam os malefícios. Estes últimos seriam “brechas” que podem ser superadas dentro em breve com a orientação da globalização pelos valores da bondade e solidariedade. Nós, os animadores de Justiça e Paz, colocamos questões sérias como o crescente aumento da diferença entre ricos e pobres, a realidade das populações excluídas, que morrem de fome e não podem inserir-se no processo de globalização que privilegia os detentores da técnica informatizada, a manipulação dos meios de comunicação social para favorecer o consumismo e supremacia dos fortes (países ricos e as grandes corporações industriais e financeiras) e a crescente degradação da natureza. A este respeito, devemos nos posicionar em nossa carta compromisso, guiando nossa posição pela solidariedade aos pobres e excluídos. “Globalizar a solidariedade”, respeitar as diferenças culturais e soberania dos povos, guiar os MCS com uma ética que privilegia o desenvolvimento integral da pessoa humana e trabalhar a formação de consciências críticas serão os nossos lemas.

Às 20:30 horas tivemos outra “mesa redonda” guiada pelo Prof. Shaffa, pertencente à religião Bahá’í, sobre o tema do papel e organização das ONGs. As colocações de Shaffa giraram em torno de sua experiência à partir do compromisso religioso em promover o bem estar social e a paz. Os Bahá’í têm como meta unir todos os povos, raças e religiões através de uma educação espiritual dos indivíduos até a formação de uma massa crítica que trabalhe por um mundo melhor. “O verdadeiro homem é aquele que se preocupa com os bem estar de toda a raça humana”. “A globalização da economia e da tecnologia sem a globalização do ‘ser’ humano retardará o reino de Deus, mas este Deus nunca deixará de agir e nos guiar para a paz”, afirmou Shaffa. Em seu trabalho pela melhoria do bem estar social, os Bahá’í se comportam de forma autônoma na gestão econômica de suas entidades que estão presentes em todo o mundo.

Encontramos na experiência de Shaffa um testemunho importante para nós pela sua preocupação com o bem da humanidade e sua visão de unidade que dá uma característica forte de espiritualidade aos seus empreendimentos sociais. Contudo a sua colaboração ao nosso encontro não supriu uma análise mais sistemática sobre as ONGs. Discutindo sobre isto após sua apresentação, percebemos, que este fator de uma espiritualidade ou ideal humanitário não poderá faltar em nenhuma organização não governamental. Além do mais, devemos tomar cuidado nas questões do papel da ONGs em confronto com a responsabilidade do Estado em prover os direitos básicos do cidadão, e a manutenção financeira das ONGs,especialmente nos países pobres, pelo capital estrangeiro sem um questionamento dos seus objetivos.

Dia II:

Às 08:30 horas do dia 06 de Abril iniciamos o segundo dia do nosso encontro com a “mesa redonda” sobre Análise Estrutural”, guiada pelo Pe. Nestor Eckert, scj. O mesmo começou suas colocações partilhando sua dúvida com relação ao tema proposto, pois não tinha claro se este pedia um explanação de como se faz análise estrutural ou pedia uma análise sua da situação atual. Ainda, Pe. Eckert, fez questão de diferenciar “análise estrutural” de “análise conjuntural”. A primeira indica uma tarefa mais complexa pois refere-se à organização, disposição e ordem dos elementos essenciais que compõem um corpo. A segunda refere-se à combinação ou concorrência de acontecimentos ou circunstâncias num dado momento; conjunção de elementos de que depende, num dado momento, a situação política, econômica, social etc. Dum país ou grupo de países ou de uma região. Análise de conjuntura é mais viável. É possível um misto de análise estrutural e conjuntural.

Assim, usando a metodologia de quadros sintéticos da situação, numa panorâmica, tentamos entender como se apresenta estruturalmente a situação mais geral, hoje. Estes quadros sintéticos usados pelo Pe. Eckert nos levou a perceber melhor a situação atual da economia, organização social, cultura entendida como modo de viver, educação e política (Conf. Anexo II).

Às 14:00 horas nos reunimos novamente para partilharmos as experiências e implementações de cada província suscitadas pela última Conferência Geral de Recife e assim nos prepararmos melhor para o Encontro de Montreal. Esta partilha foi guiada pela leitura das opções, propostas e prioridades da mensagem final da Conferência de Recife e por um questionário (Conf. Anexo III) fornecido pela coordenação do presente encontro.

Ao lermos a mensagem final da Conferência de Recife percebemos que alguns governos provinciais e regionais não assumiram de forma explícita as propostas desta como diretriz para a vida das províncias e regiões, ficando apenas no nível pessoal suscitado pela leitura da referida mensagem pela Festa do Sagrado Coração no ano de 2000. Refletimos que ainda persistem problemas com relação ao testemunho de pobreza quando não fornecemos claramente os dados dos gastos e honorários pessoais e comunitários. Preocupa-nos ainda a crescente ostentação de um padrão de vida próprio das classes mais abastadas. Com relação à formação e informação dos membros da congregação e do povo a nós confiado insistimos junto aos governos provinciais e regionais que invistam na formação acadêmica dos religiosos e leigos na área de Justiça e Paz. Neste campo, engrandecemos as iniciativas de muitas províncias e regiões na formação dos leigos e seminaristas. Estamos encontrando dificuldades em entender e efetuar a nossa associação aos projetos das ONGs e de voluntariado internacional. Alegra-nos a crescente valorização dos leigos à nível de toda a nossa área geográfica. Sobre a gestão econômica insistimos que levemos mais à serio a propostas de realizarmos investimentos éticos e transparentes, bem como o tratamento justo com os nossos empregados, não somente com relação às leis trabalhistas, mas com aquilo que nos caracterizaria como patrões verdadeiramente cristãos. Encontramos na proposta dos fundos de solidariedade a nível local algo que não tem sido suficientemente realizado até agora. Nossa luta pela justiça e pela paz continua com um trabalho incansável na educação da consciência social, na luta pela solução do problema da dívida externa e na defesa da ecologia.

As respostas do questionário levaram-nos a concluir o seguinte:

-Para alguns houve mais empenho na preparação da Conferência Geral do que na retomada da mesma. Contudo, na província do Chile, por exemplo, percebe-se que houve uma renovação do espírito da Comissão de Justiça e Paz. Em geral, o trabalho das comissões ou assessorias tem sido mais efetivo na motivação, formação dos membros da congregação e leigos na área da Doutrina Social da Igreja e na solidariedade efetiva aos movimentos sociais transformadores de hoje (Grito dos Excluídos, luta contra a dívida externa, corrupção eleitoral, serviço de proteção à testemunha de crimes políticos e institucionais, etc).

-O testemunho de uma simplicidade de vida deve ser tomado pelos governos provinciais e regionais como algo a ser incentivado e orientado de forma mais explícita. Não cabe às comissões de Justiça e Paz como tais a tarefa de guiar a vivência do voto de pobreza no sentido acima citado.

-Alguns projetos de ação solidária e formadora têm surgido e prometem ser sementes de um revigoramento da ação social concreta em nossas províncias e regiões (estudos de implantação do Instituto Dehoniano de Solidariedade pela província do Brasil Central e do Centro Dehoniano de Medicina Popular pela província do Nordeste, B.S.).

-A colaboração interprovincial na área da formação inicial e permanente tem sido satisfatória, apresentando exemplos louváveis como o noviciado e cursos específicos de preparação dos votos perpétuos e religiosos jovens. A colaboração missionária precisa ser aprofundada, especialmente no compromisso assumido com a missão no Uruguai.

Após esta partilha, aproveitando a presença do Pe. Carlos Alberto, foram esclarecidos alguns encaminhamentos sobre o Encontro de Montreal e a necessidade de termos uma organização mais definida à nível Latino-Americano dos trabalhos de Justiça e Paz. Decidimos pela formação de assessoria latino-americana responsável em coordenar os encontros a nível de área geográfica e informar/formar as instâncias provinciais e regionais de Justiça e Paz. Elegemos o Pe. Renato Cadore, da região do Maranhão como nosso Assessor Latino-Americano e o autorizamos a apresentar um projeto financeiro para o desempenho de sua função durante os próximos dois anos. Concluímos o nosso encontro com as palavras finais de agradecimento e incentivo a continuarmos a nossa missão proferidas pelo Conselheiro Geral Pe. Carlos Alberto e pelo Coordenador do Encontro Pe. Renato Cadore. Este último, ainda nos guiou em um momento final de oração pedindo a intercessão de Maria Santíssima pelos nossos trabalhos, pelos encontros dos religiosos jovens e da pastoral vocacional da América-Latina que se realizarão nestes próximos dias em Jaraguá do Sul, Santa Catarina.

Curitiba, 07 de Abril de 2001.

Pe. Marcos Antonio Alves de Lima, scj.
Fr. Ricardo Menay Pino, scj.
Secretários ad hoc